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sábado, dezembro 21, 2024

Pandemia agrava situação de refugiados e deslocados internos, aponta ACNUR

De acordo com a edição de 2021 do relatório Tendências Globais, 82,4 milhões de pessoas estão em situação de deslocamento forçado no mundo; pandemia também aparece como fator de deslocamento

As restrições em fronteiras criadas em meio à pandemia podem ter freado o crescimento de refugiados no mundo, mas os deslocamentos forçados – e os motivos que provocam esse êxodo – seguiram em alta no último. Essas são alguns dos aspectos revelados pela edição de 2021 do Tendências Globais (Global Trends, em inglês). O relatório, divulgado nesta sexta-feira (18) pelo ACNUR (Alto Comissariado da ONU para Refugiados), faz um retrato da situação do refúgio e do deslocamento forçado no mundo a partir dos dados consolidados até o final de 2020.

De acordo com o relatório, o mundo terminou o ano passado com um total de 82,4 milhões de deslocados forçados, um crescimento de 3,6%. Ou seja, uma em cada 95 pessoas no mundo vive sob tal situação. Desse grupo, 26,4 milhões são considerados refugiados de fato (porque se deslocaram para um outro país). O número apresenta ligeiro crescimento, se comparado com os 26 milhões já computados pelo ACNUR no ano anterior.

Já a parcela de deslocados internos passou de 45,7 milhões ao final de 2019 para 48 milhões no encerramento de 2020 – mais da metade (58%) da população analisada pelo ACNUR. Um quadro agravado por conflitos e outros fatores encontrados em locais como Etiópia, Sudão, países do Sahel, Moçambique, Iêmen, Afeganistão e Colômbia.

Os números consideram ainda 4,1 milhões de solicitantes de asilo, 5,7 milhões de refugiados palestinos (sob o mandato de uma agência da ONU específica, a UNRWA) e 3,9 milhões de venezuelanos deslocados por outras nações. Embora muitos países não reconheçam a situação do país sul-americano como de grave e generalizada violação de direitos humanos, citar os nacionais do país em uma categoria separada foi a foma encontrada pela agência da ONU para visibilizar a questão venezuelana em seu relatório.

A Venezuela, aliás, só fica atrás da Síria como país de origem de pessoas em situação de deslocamento forçado. Junto com outros três países (Afeganistão, Sudão do Sul e Mianmar), correspondem a 68% do total de refugiados.

PaísNúmero de refugiados (2020)
Síria6,7 milhões
Venezuela3,9 milhões
Afeganistão2,6 milhões
Sudão do Sul2,2 milhões
Mianmar1, milhão
Fonte: ACNUR

O relatório ainda mantém tendências já observadas em edições anteriores. Os países que mais recebem refugiados no mundo atualmente são Turquia, Colômbia, Paquistão, Uganda e Alemanha. Exceto pelo país europeu, principal destino do fluxo migratório que partia do Oriente Médio em direção à Europa em 2015 e 2016, todos os demais são vizinhos de nações que produzem refugiados e deslocados internos forçados. De acordo com o ACNUR, 73% dos refugiados vivem em países vizinhos e 86% estão abrigados nos chamados países em desenvolvimento.

País receptorNúmero de refugiados recebidos (2020)
Turquia3,7 milhões
Colômbia1,7 milhão
Paquistão1,4 milhão
Uganda1,1 milhão
Alemanha1,1 milhão
Fonte:ACNUR

Menores de 18 anos representam 42% de todas as pessoas deslocadas à força. O relatório mostra ainda que quase um milhão de crianças nasceram como refugiadas entre 2018 e 2020. Uma situação que, conforme mostram as tendências anteriores, podem se prolongar por muitos anos. 

Fator pandemia

Embora guerras e perseguições ainda sejam os principais fatores de deslocamento forçado, a presença do novo coronavírus tem aprofundado problemas tanto nas políticas locais quanto transnacionais, além de afetar o próprio sistema de proteção internacional.

Em maio do ano passado, 164 países estavam com as fronteiras fechadas, e 99 deles não abriram nenhuma exceção para a entrada de refugiados. As restrições descresceram ao longo do ano, mas 63 países ainda vetavam entrada para todos, inclusive quem busca proteção internacional ao final de dezembro.

“O relatório aponta claramente que o aumento sem precedentes no número de deslocados internos está sim associado à COVID (além dos próprios conflitos, como em Moçambique, Iêmen e Etiópia), assim como uma queda no número de pedidos de reconhecimento de refúgio. É importante lembrar que no pico da pandemia, no ano passado, 169 países estavam com suas fronteiras fechadas – 99 deles sem qualquer exceção para pessoas em necessidade de proteção internacional. Atualmente, 52 países seguem nesta situação”, ressaltou Luiz Fernando Godinho, porta-voz do ACNUR no Brasil.

O Acnur recomenda a adoção de medidas que permitam a assistência a essas pessoas em vulnerabilidade e respeitando as questões sanitárias. O relatório cita o exemplo de Uganda, que aceitou pessoas da vizinha República Democrática do Congo, mediante exigência de quarentena ao entrar.

A pandemia também surge como um entrave adicional ao reassentamento de refugiados. Embora seja um recurso histórico de resposta do ACNUR aos deslocamentos forçados, o reassentamento teve apenas 34 mil casos no mundo em 2020, o menor nível em 20 anos.

Apesar da queda, o ACNUR conserva o reassentamento como uma resposta adequada e humana ao refúgio e deslocamento forçado. E cita como exemplo os Estados Unidos, que depois da mudança de governo – de Donald Trump para Joe Biden – manifestou interesse em ampliar seu programa de reassentamento. “O fato de o governo dos Estados Unidos estar expandindo o seu programa de reassentamento é um indicador forte, real e simbólico”, disse Godinho.

Chamado global

O Tendências Globais é divulgado anualmente pelo ACNUR às vésperas do Dia do Refugiado, lembrado em 20 de junho. A agência pediu aos líderes mundiais que intensifiquem seus esforços para promover a paz, com o objetivo de reverter a tendência de aumento do deslocamento que dura há uma década. 

“Atrás de cada número há uma pessoa forçada a fugir de sua casa e uma história de deslocamento, perda de bens e sofrimento. Estas pessoas merecem nossa atenção e apoio não apenas com ajuda humanitária, mas com soluções duradoras para sua situação”, disse o Alto Comissário da ONU para Refugiados, Filippo Grandi, em comunicado de imprensa.

Grandi prossegue, afirmando que os principais líderes internacionais devem fazer sua parte. “As soluções exigem que os líderes globais e aqueles com influência deixem de lado suas diferenças, acabem com uma abordagem egoísta da política e, em vez disso, foquem na prevenção e solução de conflitos e na garantia do respeito pelos direitos humanos.” 

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