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quinta-feira, novembro 21, 2024

Suprema Corte do Reino Unido rejeita plano do governo de deportar refugiados para Ruanda

Gabinete do premiê Rishi Sunak ainda tenta retomar o plano, enquanto organizações humanitárias consideram a decisão da Corte uma vitória e um recado para outros países europeus

Atualizado às 12h10 de 17.nov.2023

Por unanimidade, os cinco juízes que formam a Suprema Corte do Reino Unido rejeitaram o plano do governo britânico de enviar para Ruanda solicitantes de refúgio. A medida, vista como forma de tentar frear o fluxo migratório em direção ao país, era alvo constante de críticas de organizações humanitárias e de agências das Nações Unidas.

O presidente da Suprema Corte, Lord Reed, afirmou na última terça-feira (14) que os juízes concordaram unanimemente com a decisão do Tribunal de Apelação de Londres, emitida em junho deste ano. A instância anterior já havia entendido que havia um risco real de que as solicitações de refúgio fossem erroneamente julgadas em Ruanda, resultando em requerentes erroneamente devolvidos aoos países de origem.

Ele destacou evidências cruciais da agência de refugiados das Nações Unidas, o ACNUR, que ressaltou o fracasso de um acordo semelhante de deportação entre Israel e Ruanda.

Neste ano, segundo dados do governo britânico, mais de 27 mil pessoas chegaram à costa sul do Reino Unido sem autorização.

Em junho, duas agências da ONU, o Escritório de Direitos Humanos e a Agência para Refugiados (ACNUR) emitiram comunicado conjunto no qual cobraram do governo britânico o respeito, a proteção e o cumprimento dos direitos de todos os migrantes, refugiados e requerentes de asilo, sem discriminação.

Revés para Sunak

A decisão representa um duro revés para o premiê Rishi Sunak, do Partido Conservador, que tem como uma de suas principais bandeiras a redução do fluxo migratório. Ele, porém, já antecipou que deve buscar alternativas para retomar o plano.

“Estou preparado para alterar nossas leis e revisitar essas relações internacionais para remover os obstáculos em nosso caminho. Se o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos optar por intervir contra o Parlamento, estou disposto a fazer o que for necessário para retomar os voos”, falou o premiê por meio das redes sociais.

Sunak, inclusive, cogita retirar o Reino Unido do tribunal europeu caso a instância se coloque contra o plano de enviar para Ruanda solicitantes de refúgio.

Em junho de 2022, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos concedeu uma liminar temporária que impediu a decolagem do primeiro voo com destino a Kigali, capital ruandesa, horas antes de sua partida.

Além disso, há um componente eleitoral por trás da impaciência do premiê. Sua legenda, o Partido Conservador, está 20 pontos atrás da oposição nas pesquisas de opinião para as eleições de 2024. E o tema da migração deve seguir forte também neste pleito, tal como tem ocorrido em outros países europeus.

Vale lembrar que o Reino Unido não está sozinho na proposição de políticas que visam restringir a migração a partir de acordos com países terceiros. Recentemente, a Itália anunciou um acordo com a Albânia que prevê criar no país balcânico centros de pré-deportação sob jurisdição italiana.

Além disso, a própria União Europeia, entre outros acordos, firmou entendimentos com Turquia e Tunísia no sentido de tentar barrar os migrantes que chegam à Europa passando por esses dois países.

Decisão celebrada

Ao mesmo tempo, a decisão da Suprema Corte Britânica é uma nova conquista para organizações humanitárias, que lutam contra o projeto desde o momento em que ele foi apresentado, ainda durante o governo Boris Johnson, em abril de 2022.

“Esta decisão é um ato poderoso que reafirma os valores de solidariedade e bondade que sustentam nossas estruturas e tratados de direitos humanos”, declarou a Platform for Undocumented Migrants (PICUM), em nota divulgada nas redes sociais.

Na mesma linha, a West London Welcome, organização de apoio a migrantes na capital britânica, afirmou que a decisão da Suprema Corte representa uma oportunidade para o governo repensar a política de asilo para um sistema que proteja direitos e rejeite ações hostis.

“A decisão oferece ao governo a oportunidade de seguir um novo caminho na política de asilo. A Suprema Corte é clara: aqueles que buscam asilo devem ter seus direitos protegidos. Apelamos ao Primeiro-Ministro e ao Secretário do Interior para recomeçar, reverter sua abordagem hostil e criar políticas humanitárias que permitam às pessoas em busca de refúgio vivenciar um sistema de asilo justo e funcional”.

“O aumento do acúmulo de pedidos de asilo custou milhões por dia ao contribuinte britânico. Pense nos milhões já pagos a Ruanda, que não podem ser recuperados. Os custos legais de lutar neste caso. O custo de prosseguir, construindo os campos de detenção necessários e transportando dezenas de milhares de refugiados para Ruanda seria enorme. Acima de tudo, há o custo de oportunidade de investir tanto tempo e energia nesse projeto de vaidade fracassado. Já é o bastante. O governo deve seguir em frente com sua tarefa cotidiana de administrar um sistema de asilo funcional”, complementou outra instituição de apoio a migrantes no Reino Unido, a Free Movement UK.

Recado a outros países

Ao comentar a decisão da Suprema Corte Britânica, a organização internacional Human Rights Watch afirmou que o caso deve servir de exemplo para outros países que estão tentando usar terceiros como forma de restringit o acesso a seus territórios.

“O governo do Reino Unido deveria abandonar seu acordo ilegal com Ruanda e não buscar acordos semelhantes. Isso deve servir como um alerta para outros governos que estejam pensando em transferir suas responsabilidades de asilo para outros países. O Reino Unido também deveria revogar sua recente Lei de Migração Ilegal e, em vez disso, criar um sistema de asilo funcional e justo que trate as pessoas com compaixão e lhes permita encontrar refúgio no Reino Unido”.

A OIM (Organizção Internacional para as Migrações), por sua vez, disse reconhecer os desafios enfrentados por muitos Estados em relação às chegadas irregulares e as pressões sobre governos e comunidades para lidar com esses desafios. Mas ressaltou a necessidade de garantia de direitos e de dignidade para as pessoas que buscam melhores condições de vida.

“Encorajamos o Reino Unido e outros Estados-Membros a buscar soluções que abordem os fatores subjacentes que levam as pessoas a deixar seus lares, a oferecer vias expandidas e seguras para a migração legal, e a estabelecer parcerias com governos ao longo da rota migratória”.

Com informações de The Guardian, Folha de S. Paulo e ONU News

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