O empreendedorismo tem crescido cada vez mais no Brasil — inclusive entre imigrantes que buscam maneiras de reconstruir sua vida no país. De acordo com a Agência Sebrae, o número de microempreendedores individuais (MEI) estrangeiros cresceu 73% entre 2019 (42,9 mil) e 2023 (74,2 mil). Dentre eles, 1 a cada 4 trabalhadores atua no varejo de vestuário (15%) e na confecção de roupas (10%). As áreas de beleza (6%) e alimentação (4%) também estão entre as mais recorrentes.
As nacionalidades com maior número de MEIs são todas de países da América do Sul: Venezuela (14%), Bolívia (13%), Colômbia (9%), Argentina (8%), Uruguai (5%) e Peru (4%). Juntas, representam 56% do total.
Para Décio Lima, presidente do Sebrae, esse movimento revela o potencial do empreendedorismo como ferramenta de inclusão: “Muitos estrangeiros, entre eles refugiados, veem no empreendedorismo uma forma de inclusão social e econômica. A figura jurídica do MEI, criada há 15 anos, torna mais fácil ainda essa inclusão dos estrangeiros na economia brasileira”.
Projeto Negócio Raiz abre portas para o empreendedorismo de refugiados no Brasil
É nesse contexto que se insere o Projeto Negócio Raiz, uma iniciativa da Aliança Empreendedora com apoio da Youth Business International (YBI) e financiamento da Standard Chartered Foundation, por meio do programa Futuremakers do Standard Chartered. A ação tem como objetivo fortalecer o empreendedorismo nas regiões Norte e Nordeste do país, beneficiando mais de 800 microempreendedores.
Um dos participantes é Wuilinton Quintero, venezuelano que vive há seis anos em Manaus (AM). Ele encontrou no empreendedorismo uma maneira de reconstruir sua vida com dignidade no Brasil. Formado como cabeleireiro pelo Senac, começou atendendo clientes em domicílio e hoje, ao lado do companheiro, é dono do Studio W&E.
Apesar de enfrentar desafios como a barreira do idioma, a adaptação cultural, a informalidade e até a pandemia, Wuilinton se manteve resiliente. Seguiu trabalhando mediante agendamento e reconhece o impacto do Negócio Raiz em sua trajetória. Segundo ele, o programa foi essencial para apoiar seu crescimento profissional e garantir a formalização e estabilidade do estúdio.
Tecendo Sonhos capacita imigrantes latino-americanas na área da moda
A Aliança Empreendedora também promove o Projeto Tecendo Sonhos, parte do Programa Moda Justa e Sustentável, com foco na capacitação de mulheres imigrantes latino-americanas. A iniciativa aborda temas como saúde financeira, formalização, trabalho justo e empoderamento feminino.
Segundo Cristina Filizzola, coordenadora do programa e presidente da Aliança Empreendedora, “essas iniciativas mostram que, com apoio certo e integrado com outras organizações, o empreendedorismo pode ser não só uma alternativa viável, mas um caminho necessário para quem recomeça no Brasil, já que muitos desses imigrantes enfrentam desafios para se inserir no mercado formal de trabalho no país”.
O Tecendo Sonhos promove relações mais justas e dignas na cadeia têxtil, com atenção especial às facções de costura. O projeto oferece capacitação empreendedora gratuita e presencial em São Paulo (SP), promovendo o entendimento do funcionamento da cadeia produtiva da moda.
Na edição de 2024, 36 mulheres participaram de encontros formativos voltados ao empreendedorismo na costura. Três delas foram premiadas — entre elas, Arody Poma, boliviana que chegou ao Brasil em situação de vulnerabilidade e enfrentou condições de trabalho análogas à escravidão.
Sem documentação e com medo da deportação, Arody demorou a acessar seus direitos. Foi ao conhecer o Tecendo Sonhos por indicação de duas mulheres imigrantes que já haviam feito o curso, que encontrou a oportunidade de formalizar sua oficina e expandir seu negócio. Hoje, vive na zona norte de São Paulo, mantém sua oficina regularizada e sonha em contratar outros imigrantes, compartilhando com eles os caminhos que descobriu. No futuro ela também pretende lançar suas próprias criações e levar seus desenhos autorais a mais pessoas.
Outras iniciativas que fortalecem o empreendedorismo de migrantes no Brasil
Além dos projetos promovidos pela Aliança Empreendedora, outras organizações também têm atuado para fomentar o empreendedorismo de refugiados e imigrantes no país. Um exemplo é o Impulsione com Facebook, iniciativa lançada em 2020 em parceria com o Migraflix, que ofereceu conteúdos gratuitos em vídeo sobre finanças, gestão e modelos de negócios, com o objetivo de apoiar estrangeiros no desenvolvimento de seus próprios empreendimentos.
O Migraflix é uma organização social brasileira, fundada em 2015 e liderada pelo empreendedor argentino Jonathan Berezovsky, com a missão de promover a inclusão socioeconômica de imigrantes e refugiados por meio da cultura e do empreendedorismo. A ONG oferece oficinas culturais, formações digitais, programas de empreendedorismo e projetos voltados para plataformas de mercado.
Um de seus projetos de destaque foi o Raízes na Cidade, realizado em 2019 em parceria com o Airbnb. A ação capacitou refugiados e imigrantes residentes em São Paulo a se tornarem empreendedores culturais, ofertando experiências na plataforma relacionadas à gastronomia, dança, música, poesia, teatro e outras expressões artísticas ligadas à história de vida dos participantes. Foram selecionadas 50 pessoas de 20 países diferentes — como Síria, Haiti, Bolívia, Jordânia, Cuba, Colômbia e República Democrática do Congo — sendo 52% delas mulheres.
Durante a pandemia de Covid-19, o Abraço Cultural, projeto que oferece cursos de idiomas com professores refugiados, lançou a campanha #AbraceDaí, em parceria com a plataforma Atados. A iniciativa teve como objetivo acolher a população de refúgio e dar visibilidade a pequenos negócios de alimentação e artesanato, com foco na adaptação desses empreendimentos ao modelo de vendas online.
Ainda nesse período, a organização Círculos de Hospitalidade, de Santa Catarina, criou o perfil Empório Migrante no Instagram, como forma de gerar renda e ampliar a visibilidade de pequenos negócios liderados por imigrantes e refugiados. A conta passou a divulgar histórias empreendedoras, promovendo a economia criativa, a geração de renda e a conscientização sobre o tema do refúgio.
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