Por Ramana Rech Duarte
Principal destino dos venezuelanos que migraram para o exterior, a Colômbia recebeu pelo menos 1,8 milhão de pessoas do país vizinho desde 2017, segundo dados da autoridade migratória local. Com a pandemia do novo coronavírus (Covid-19), um total de 80 mil desses cidadãos decidiram retornar ao país natal entre março e julho. Mas essa parcela da diáspora venezuelana vem encontrando resistência do governo de Nicolás Maduro para seu retorno.
O sucessor de Hugo Chávez sustenta uma narrativa segundo a qual os casos de Covid-19 da Venezuela são, em sua maioria, importados pelos retornados. Até o dia 26 de agosto, a Venezuela reportava 41.965 casos oficiais de coronavírus e 351 mortes. Já na Colômbia esse número é de 572 mil casos e 18.184 mortes. Apesar dessa diferença, muitos especialistas chamam a atenção para a subnotificação presente na Venezuela.
Em seu Twitter, o ministro de Relações Exteriores da Venezuela, Jorge Arreaza, afirmou no dia 9 de junho que 9 em cada 10 casos de Covid-19 na Venezuela provém de cidadãos que retornaram de países como Colômbia, Peru e Equador. Atacando esses países, acrescentou que isso provava “o péssimo manejo sanitário e o subregistro” dos governos.
Discurso contra ‘trocheros’
No dia 15 de julho, foi a vez do presidente Nicolás Maduro. Por meio de um ato televiso, ele estimulou a denúncia de “trocheros”, venezuelanos que retornam, principalmente do Brasil e da Colômbia, utilizando rotas irregulares — e, por isso, sem cumprir quarentena preventiva.
“Um trochero ou uma trochera infectado é um bioterrorista na sua região que pode acabar com a sua vida, com a vida de sua família”, dizia uma mensagem que Maduro leu na ocasião. Segundo a revista Forbes Colômbia, mais tarde, a mesma mensagem foi replicada por algumas contas do Twitter vinculadas às Forças Armadas da Venezuela.
Maduro acusou ainda o presidente da Colômbia, Iván Duque, de ter um plano para infectar a população venezuelana através dos “trocheros”. Ele comentou ainda que o país está de “braços abertos” para receber aqueles que desejarem voltar e completou: “mas que passem regularmente”.
Antes de ultrapassar a fronteira, é necessário passar pela triagem que é feita sob o controle das Forças Armadas e da polícia. Muitos desconfiam que esse plano sanitário também é uma forma de identificar dissidentes que significariam uma ameaça política para o Estado de Maduro e, assim, mantê-los afastados.
Uma reportagem do diário espanhol El País do dia 9 de junho aponta as diferenças entre as ações do governo venezuelano e seu discurso, dada as medidas de restrições em relação a passagem dos repatriados.
Dentre elas, a autorização da entrada de 300 pessoas pela Ponte Internacional Símon Bolívar, que liga Santander (Colômbia) ao Estado de Táchira (Venezuela), e de somente 100 venezuelanos em Arauca, através da Ponte Internacional José Antonio Páez. Além disso, a passagem legal também ficou restrita aos dias de segunda, quarta e sexta-feira. Nisso, as filas para atravessar a fronteira acumulam gente e causam aglomerações.
Amargo regresso
Outro problema relatado pela oposição na BBC Colômbia são os albergues onde os venezuelanos devem fazer quarentena por 14 dias antes de terem acesso ao resto do país. A oposição afirmou que as situações passadas pelos imigrantes lá são “infrahumanas”.
Os retornos são motivados por questões como xenofobia, perda do emprego ou da renda no país receptor. Conforme os dados do Observatorio de Venezuela de la Universidad del Rosario, 90% dos imigrantes venezuelanos são trabalhadores informais
No portal de notícias R7, uma matéria cita o fato de muitos terem sido despejados de suas moradias na Colômbia. Outros relatam não conseguirem mais achar casas para alugar.
Cerca de 200 venezuelanos se reuniram no centro de Bogotá, na Colômbia, a fim de protestar contra a falta de auxílio para retornarem a seus países de origem em meados de abril. Eles pediam que o Governo Nacional e a prefeitura arcassem com custos de vôos e ônibus de repatriação.
“Não nos prestam atenção. Aqui somos 200, mas, pelo menos, 1.500 venezuelanos estamos organizados e queremos deixar Colômbia, mas não temos recursos para ir embora”, disse um dos líderes.
Na época, a Migração Colômbia se manifestou em uma nota de imprensa afirmando que coordenaria esse retorno “de maneira controlada e sem gerar risco à saúde de todos os cidadãos”.
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