Depois de conseguir a aprovação do decreto que restringiu a transmissão da cidadania italiana por descendência, o governo liderado pela primeira-ministra Giorgia Meloni obteve uma nova vitória em sua política de restrição às migrações no país europeu. O referendo ocorrido no final de semana que propunha reduzir o prazo para imigrantes em situação regular no país solicitarem a cidadania foi invalidado por falta de quórum.
Convocado por setores ligados à centro-esquerda, que fazem oposição ao governo Meloni, de ultradireita, o referendo era composto por cinco perguntas. Uma delas dizia respeito à redução de 10 para cinco anos do tempo necessário de residência na Itália para que o migrante possa solicitar cidadania. Além disso, a consulta também questionava sobre reverter flexibilizações nas leis trabalhistas aprovadas ao longo dos últimos 10 anos.
Pela lei italiana, é necessário que mais da metade dos eleitores (50% + 1) votem em referendos. No entanto, de acordo com o Ministério do Interior, 29,89% dos 51,3 milhões de cidadãos com direito a voto foram de fato às urnas nas seções eleitorais da Itália e no exterior (sendo 30,58% em solo italiano e 23,76% nas representações em outros países).
Ainda de acordo com a apuração oficial, da minoria de italianos que foi às urnas, cerca de 85% votaram “sim” em todas as questões trabalhistas e 64% na proposta sobre a cidadania. No entanto, a baixa presença dos eleitores invalidou o resultado.
Comemoração do governo e reação
O fracasso do referendo foi celebrado pelo governo Meloni e seus integrantes, que fizeram campanha pela abstenção dos eleitores sobre essa consulta. A própria premiê foi até uma seção eleitoral, no domingo, mas não depositou seus votos.
Ao mesmo tempo, mesmo entre apoiadores da consulta surgiu um sentimento de frustração com o uso do referendo como instrumento político, especialmente diante dos custos e da baixa participação popular.
“Grande derrota para uma esquerda que não tem mais ideias, credibilidade e nem sequer é capaz de mobilizar seus próprios eleitores”, disse no X (antigo Twitter) o vice-premiê e ministro da Infraestrutura e dos Transportes da Itália, Matteo Salvini, líder do partido Liga, que é anti-imigração.
“Tenho grande respeito por quem votou, porque o referendo é sempre uma forma de participação. Dito isso, foi uma derrota da esquerda e da oposição. O governo saiu mais forte”, destacou o também vice-premiê e ministro das Relações Exteriores, Antonio Tajani. Ele também foi um dos idealizadores do decreto convertido em lei que restringiu a transmissão da cidadania italiana por descendência.
O secretário-geral do CGIL, Maurizio Landini, disse em coletiva após a consulta popular que a alta taxa de abstenção reflete uma “clara crise democrática” na Itália. Ao mesmo tempo, procurou valorizar aqueles que foram às urnas.
“O quórum não foi alcançado, mas mais de 14 milhões de italianos votaram, e para nós é um número muito importante. É um ponto de partida, pois os problemas que levantamos com os referendos continuam todos na mesa. Há um ano, quando recolhemos as assinaturas, sabíamos que não seria fácil”
“Nosso objetivo era atingir o quórum, é claro que não o alcançamos. Hoje não é um dia de vitória”, afirmou. Ele, porém, destacou o fato de que muitos italianos foram votar (cerca de 14 milhões) e disse que esse era “um número inicial” para continuar lutando por mudanças.
Em resposta a essa defesa pelo boicote, um grupo de cidadãos começou durante o referendo a coletar assinaturas para um futuro projeto de lei de iniciativa popular para acabar com o quórum mínimo em referendos que visam revogar leis.
“O quórum é um instrumento danoso para a democracia por desestimular a participação dos cidadãos e transformar a abstenção em uma arma estratégica para as minorias”, disse o comitê responsável pelo projeto.
Outra discussão sobre cidadania italiana
Além do referendo fracassado e da nova lei que restringe a cidadania por sangue, também se discute na Itália o Ius Scholae, uma reforma que permitiria a concessão de cidadania local a não-italianos após a conclusão de 10 anos de escolaridade obrigatória no país europeu.
Esse debate ganhou força após os Jogos Olímpicos de 2024, no qual a seleção italiana feminina de vôlei obteve uma inédita medalha de ouro. E um dos principais nomes do time é Paola Egonu, filha de imigrantes nigerianos e nascida na Itália, mas que só obteve a cidadania local já durante a adolescência.
Um mural elaborado em sua homenagem em Roma foi vandalizado pouco depois da conquista, sob o “pretexto” de que a atleta não representaria de fato o “ser italiana” por ter pele negra. Dois anos antes do ouro olímpico, Egonu chegou a manifestar o desejo de se afastar da seleção nacional devido ao persistente abuso racista que enfrentava.
Com informações da Ansa, Deutsche Welle e La Via Italia
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