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sábado, novembro 23, 2024

Com grafites, artista pede paz na Palestina e lida com trauma de infância

Cada desenho é um tipo de protesto contra a guerra e contra os muros – materiais e imateriais que separam pessoas e afastam acordos de paz

Por Alethea Rodrigues
Em Bethelem/Belém (Cisjordânia)
Atualizado às 16h55 em 19.fev.2019

Ele não quer aparecer e prefere ser chamado de Cakes*, mas aceitou contar sua história de vida e dos seus mais de cem grafites estampados em um dos muros mais polêmicos do mundo. O europeu de 33 anos também prefere não revelar o país que nasceu, para evitar qualquer risco. Afinal, grafitar no muro de 750 km de extensão construído por Israel supostamente para impedir o acesso dos palestinos à cidade de Jerusalém é algo que exige cautela.

O grafiteiro esteve pela primeira vez na Palestina em 2017. “Eu ouvi falar sobre o muro e que existia a possibilidade de desenhar nele. Visitei o local, analisei o ambiente tentando entender o que realmente acontecia ali e decidi criar algo que não fosse tão bonito, mas muito significativo”, contou o artista.

Ao retratar sombras de crianças no muro, artista pede paz e lida com o próprio passado. Crédito: arquivo pessoal

Os desenhos de Cakes são fáceis de serem identificados: são na maioria das vezes pequenos, sempre crianças e na cor preta, com o intuito de representar sombras. Cada um deles simboliza um tipo de protesto contra a guerra e a construção de muros – materiais e imateriais – que separam as pessoas e deixam a paz na Palestina cada vez mais distante.

Milhares de turistas que passam pela região podem enxergar com facilidade que cada grafite representa, mas o artista explica que o significado deles vai um pouco mais além do que se vê.

Com grafites de crianças, artista europeu pede paz em muro que separa Palestina de Israel. Crédito: arquivo pessoal

Para exorcizar o passado

“Minha vida não era fácil. Encontrei na Palestina uma forma de ajudar quem precisa de paz e aprender a lidar com esse trauma. Quando você é criança e seu passado social é difícil como das que vivem em campos de refugiados palestinos, isso cria diferentes micro mundos, um mundo como era o meu, onde a violência ocorre todos os dias. Eu me sinto bem aqui”, diz Cakes, que prefere não entrar em detalhes sobre sua infância. Os desenhos ajudam a lidar com os fantasmas do passdo.

O artista fez seu primeiro trabalho de rua em 2011. Na Palestina, grafita em partes do muro na região da Cisjordânia pelo menos uma vez a cada seis meses. Apesar da construção ser vigiada e controlada por câmeras israelenses 24 horas por dia, Cakes não se intimida e afirmou que nunca foi preso ou questionado por soldados israelitas.

Com grafites no muro que separa a Palestina de Israel, artista encontrou um jeito de protestar em nome da paz. Crédito: arquivo pessoal

“Não me considero uma pessoa que esteja fazendo algo errado, por isso nem sequer cubro meu rosto enquanto grafito. Não tenho nada contra ninguém e sempre acreditei, que independente da guerra, a maioria dos palestinos e israelenses querem e precisam de paz’, explicou.

Na Europa, ele tem outra profissão, a qual preferiu não revelar, mas também vende suas obras nas redes sociais para arrecadas fundos e viajar para a Palestina. “Enquanto for bem recebido aqui continuarei trazendo novas ideias”.

Arames farpados e resíduos bélicos se transformam em brinquedos nas mãos das crianças desenhadas pelo artista. Crédito: arquivo pessoal

A respeito dos planos para o futuro, o europeu revelou que já decidiu qual será o seu próximo destino. “Ouvi falar sobre o muro que está sendo construído pelo presidente dos Estados Unidos [barreira pretendida pelo republicano Donald Trump na fronteira com o México] e me interessei. Definitivamente quero conhecer esse lugar, inclusive já preparei o primeiro desenho que pretendo grafitar lá. Enquanto conseguir, continuarei enviando mensagens de paz através da minha arte, e se possível, em vários lugares do mundo”, concluiu.

Artista encontrou no grafite no muro que separa Israel da Cisjordânia uma forma de protesto contra a guerra. Crédito: arquivo pessoal
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