O Conare (Comitê Nacional para Refugiados) anunciou nesta sexta-feira (28) o reconhecimento de mais 7.992 venezuelanos como refugiados no Brasil.
Eles se juntam, assim, aos cerca de 38 mil venezuelanos já reconhecidos anteriormente como refugiados pelo governo brasileiro. Desde dezembro de 2019, já ocorreram outras três sessões do Conare que reconheceram em bloco as solicitações de refúgio de nacionais do país vizinho.
Os reconhecimentos em bloco são possíveis porque desde junho de 2019 o Brasil reconhece a Venezuela como um local de “grave e generalizada violação de direitos humanos. Esse fator, à luz da legislação de refúgio brasileira, permite uma tramitação mais célere das solicitações desse tipo proteção internacional em solo brasileiro.
“Cabe ao Comitê, em um ato humanitário, entender a situação e estender a mão para essa população que tanto precisa da nossa ajuda. É o reforço do próprio histórico migratório que o Brasil tem de acolhida, que mais uma vez se reafirma.”, aponta o coordenador-geral do Conare, Bernardo Laferté, em comunicado à imprensa.
No entanto, pelo menos desde meados de 2017 que entidades da sociedade civil ligadas à temática migratória defendiam tal reconhecimento a respeito da Venezuela. Um entendimento que partia da própria lei nacional de refúgio.
Garantia de direitos
O novo reconhecimento em bloco foi elogiado pelo representante no Brasil do ACNUR (Alto Comissariado da ONU para Refugiados), Jose Egas, também por meio de comunicado oficial.
“Esta nova rodada de reconhecimento baseado no processo facilitado de prima facie reforça a eficácia deste mecanismo em garantir a proteção de milhares de pessoas. Essa postura fortelece o compromisso do governo brasileiro em garantir direitos aos refugiados venezuelanos que buscam proteção no Brasil”, ressaltou.
A advogada especialista em migração e refúgio Aryadne Bittencourt pontua ainda que a concessão do status de refugiado para essa população traz efeitos concretos quanto à garantia de direitos previstos em lei.
“Essa perspectiva humanitária legitima ações em andamento para acolher a população venezuelana no país, bem como respalda o avanço necessário de direitos que ainda estão no campo de luta, que vão desde acesso ao território brasileiro (restringido sob justificativa da pandemia) até a efetivação de direitos básicos para condições de vida adequadas no país, como moradia, saúde e educação.
Aryadne ressalta ainda que o procedimento adotado pelo Conare poderia ser adotado por outros países em relação à Venezuela — um entendimento que também é recomendado pelo próprio ACNUR.
“Esse modelo pode ser replicado em outros países e, assim, melhorar a proteção de tantas e tantos venezuelanos ainda sem documentação e expostos a diversos riscos para suas vidas, segurança e liberdade”.
Números sobre refúgio no Brasil
Ao todo, o Brasil passa a contar atualmente com cerca de 50 mil refugiados devidamente reconhecidos pelo país. Destes, cerca de 90% (46 mil) são de nacionalidade venezuelana. Os demais 10% são compostos por pessoas de 55 nacionalidades distintas.
Segundo o Conare, atualmente, há 193.737 pedidos de refúgio no Brasil ainda em andamento no Comitê, segundo números consolidados em 31 de maio. Desses, mais de 104 mil solicitações — ou seja, 53,7% do total — são de venezuelanos.
As autoridades brasileiras estimam que aproximadamente 260 mil venezuelanos vivem atualmente no país. Até julho de 2020, mais de 130 mil solicitações de reconhecimento da condição de refugiado foram registradas por venezuelanos no Brasil.
Apesar do reconhecimento da Venezuela como passível de concessão de refúgio, o Brasil aplica a seus nacionais as medidas mais restritas de acesso ao território nacional no contexto da pandemia do novo coronavírus. Tais medidas, embora renovadas mensalmente, são questionadas pela sociedade civil e também por decisões recentes da Justiça brasileira.
Venezuelanos no mundo
O fluxo de refugiados e migrantes vindos da Venezuela é o maior êxodo da história recente da América Latina e a ONU estima que mais de cinco milhões de pessoas venezuelanas já deixaram seu país de origem.
A legislação brasileira de refúgio – Lei 9.474/97 – segue o entendimento da Declaração de Cartagena (1984) e prevê atribuição do status de refugiado a toda pessoa que foge de um país em “situação de grave e generalizada violação de direitos humanos”. No entanto, boa parte da comunidade internacional ainda não acolheu essa definição mais ampla de refúgio.
Um exemplo desse limbo é o próprio relatório geral do ACNUR divulgado em junho passado, com dados consolidados de 2019. Mesmo representando o segundo maior grupo em deslocamento forçado no mundo (3,6 milhões), os venezuelanos aparecem uma categoria à parte, chamada de “venezuelanos deslocados globalmente”.
Por haver divergências entre os países que mais acolhem os venezuelanos pelo status do refugiado ou não, o ACNUR achou ser prudente criar uma categoria especifica em seu relatório.
Ainda segundo esse estudo, 93,3 mil venezuelanos já figuram como refugiados reconhecidos mundo afora, e outros 794,5 mil como solicitantes de refúgio ao final de 2019
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