Leia o artigo em espanhol
Leia o artigo em inglês
Desde 2 abril, quase 60 mil imigrantes residentes no Brasil solicitaram ou regularizaram CPF junto à Receita Federal. É o que apontam dados obtidos pelo MigraMundo por meio da Lei de Acesso à Informação.
Ter um CPF válido era o principal requisito documental para obtenção do auxílio emergencial. O benefício foi criado no começo de abril pelo governo federal como resposta à pandemia do novo coronavírus e também foi procurado por imigrantes residentes no Brasil. O prazo para solicitação terminou no último dia 2 de julho.
A exigência do CPF se tornou uma verdadeira barreira para o acesso de imigrantes ao benefício, mesmo para aqueles que já possuíam o documento. Uma simples divergência de grafia no nome da mãe ou a ausência desse dado no cadastro de CPF junto à Receita era suficiente para emperrar a solicitação do benefício. Isso porque o formulário do auxílio requeria esse dado.
Além da dificuldade documental, instabilidades técnicas e demora no retorno sobre os pedidos de atualização também foram barreiras para imigrantes que buscaram regularizar o CPF em meio à pandemia. Com a grande maioria dos postos fechados, o atendimento ocorreu basicamente de forma remota, por formulários online e e-mail.
Dados da Receita
De acordo com os dados fornecidos pela Receita Federal, um total de 9.961 imigrantes não tinham CPF e o solicitaram a partir de 2 de abril. A maior parte dos pedidos partiu de bolivianos (2.950), seguidos por paraguaios, venezuelanos, haitianos e uruguaios.
País | Quantidade de solicitações de CPF desde 02/04 |
Bolívia | 2.950 |
Paraguai | 1.304 |
Venezuela | 1.236 |
Haiti | 854 |
Uruguai | 590 |
Por outro lado, ainda segundo a Receita, 49.838 imigrantes que estavam com CPF em situação irregular também procuraram o órgão federal para acertar a situação. Chama a atenção, no entanto, as nacionalidades que mais demandaram o serviço, em sua maioria europeias — portugueses, seguidos de italianos, japoneses e espanhóis.
País | Solicitações de regularização de CPF desde 02/04 |
Portugal | 12.239 |
Itália | 4.571 |
Japão | 4.236 |
Espanha | 3.242 |
Argentina | 2.405 |
Importante ressaltar que a solicitação e atualização do CPF realizadas em meio à pandemia não consideraram a situação migratória de quem fez o pedido, já que os serviços de regularização migratória estavam suspensos pela Polícia Federal no período.
Barreiras e dificuldades de acesso
Para a advogada Karina Quintanilha, assessora jurídica do CDHIC (Centro de direitos humanos e Cidadania do Imigrante) e e pesquisadora-curadora do Fórum Internacional Fronteiras Cruzadas, na USP, chama a atenção o fato de a maior parte das solicitações de novos CPFs partir de nacionalidades latino-americanas e caribenhas.
“Isso pode indicar que, no caso de imigrantes da Bolívia e Paraguai, apesar de refletir um fluxo caracterizado por redes sociais constituídas, apresentam condições precárias de trabalho e acesso a direitos, como a regularização de documentos e, com a perda da renda na pandemia, se viram impelidas a buscar uma forma de regularização”.
Karina, no entanto, chamou a atenção para a ausência de nacionalidades de países africanos entre as maiores solicitações ligadas ao CPF. E relacionou esse fato às desigualdades no acesso a direitos, informação e benefícios que afetam tais comunidades, além das barreiras relacionadas à língua.
A questão do idioma também é levantada pela advogada Carla Mustafa, atual presidente da Comissão do Direito do Refugiado, do Asilado e da Proteção Internacional da OAB-SP.
“Todo o trâmite de regularização do CPF está disponível no site da Receita Federal, mas o conteúdo está todo em português e isto pode ser um obstáculo para migrantes e refugiados compreenderem e buscarem auxílio”.
Mustafa ainda credita o número de solicitações de regularização de CPF por nacionalidades europeias a acordos internacionais de previdência social com os países citados pela Receita.
- Leia também: Compro comida, mas o aluguel está atrasado: imigrantes relatam como usam o auxílio emergencial
- Veja como imigrantes em SP podem denunciar negação ao auxílio emergencial e a outros direitos
*Venha ser parte do esforço para manter o trabalho do MigraMundo! Conheça nossa campanha de financiamento recorrente e junte-se a nós: https://bit.ly/2MoZrhB
*Que tal receber notícias do MigraMundo diretamente em seu WhatsApp? Basta acessar este link e entrar em nosso grupo de distribuição de conteúdo